Colocação Pronominal
Olá, nobre leitor!
No artigo de hoje, quero conversar com você sobre a colocação dos pronomes oblíquos átonos numa frase, de acordo com a gramática normativa da nossa língua.
Antes, porém, de apresentar a você os casos de colocação pronominal, cabe lembrar que próclise é a colocação do pronome oblíquo átono antes do verbo (Fingiu que não o reconheceu.). Quando acontece o inverso, ou seja, o pronome surge após o verbo, temos um caso de ênclise, que na escrita é marcada pela presença do hífen (Dá-me sua ajuda.). A mesóclise, que só ocorre com verbos no futuro do presente e no futuro do pretérito, é o emprego do pronome no meio do verbo, entre a forma infinitiva e a desinência modo-temporal (Dar-lhe-ia minha ajuda.).
Na frase a seguir, do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), notamos o pronome “se” ocupando uma posição anterior ao verbo, caracterizando a próclise: “‘Não se deve acender fósforo’, diz Gilmar Mendes sobre impasse entre poderes” (https://oglobo.globo.com/, acesso em 3/10/2017, com grifo meu).
Eis abaixo as condições em que a próclise ocorre obrigatoriamente. Tentar colocar o pronome oblíquo em outra posição com tais condições é incorrer em erro gramatical:
Casos de Próclise Obrigatória | |
a) com palavras de sentido negativo | Nada me fará desistir.
Ninguém me fará desistir. |
b) com advérbios sem pausa (separados por pontuação) | Aqui se fazem chaves.
Talvez se cumprimentassem. |
c) com conjunções subordinativas e pronomes relativos | Quando lhe dissemos a verdade, chorou muito.
O livro que me deste é muito interessante. |
d) com conjunções coordenativas alternativas | Ora se atribulava, ora se aquietava.
Das duas uma: ou as faz ela, ou as faço eu. |
e) com pronomes e advérbios interrogativos | Quem lhe contou a verdade?
Por que te afliges tanto? |
f) com pronomes indefinidos | Tudo me foi dado.
Alguém te contou a verdade? |
g) em frases exclamativas e optativas | Como te atreves!
Deus o abençoe, meu filho! |
h) entre a preposição emeverbo no gerúndio | Em se tratando desse assunto, nada mudará. |
Reforçando o que disse anteriormente, a mesóclise só ocorre quando o verbo se encontra conjugado nos seguintes tempos e modos:
Casos de Mesóclise | |
a) no futuro do presente do indicativo, sem palavra atrativa | Amar-te-ei a vida inteira. (Não te amarei a vida inteira.) |
b) no futuro do pretérito do indicativo, sem palavra atrativa | Dar-lhe-ia o livro. (Jamais lhe daria o livro.) |
A respeito dos possíveis casos de ênclise, é importante ressaltar que, se não ocorrer qualquer um dos casos mencionados acima, a tendência da norma culta da língua portuguesa é manter o pronome após o verbo, ligado a ele por intermédio do hífen:
Casos de Ênclise | |
a) se não houver palavra atrativa | Levante-se e lute.
Tratando-se desse assunto, nada mudará. Vendê-lo era o que mais importava. Aqui, fazem-se chaves. |
b) se o verbo não estiver no futuro do presente nem no futuro do pretérito do indicativo |
Alguns pontos precisam ser ressaltados neste momento:
- O particípio não admite ênclise.
*Dada-me a resposta, calei-me. (errado)
Dada a mim a resposta, calei-me. (certo)
- O numeral ambos, quando sujeito, também atrai o pronome oblíquo átono.
Ambos se casarão amanhã.
- É licita a próclise ou a ênclise quando o infinitivo estiver precedido de preposição ou palavra negativa.
Estou aqui para te servir (ou servir-te).
Meu desejo era não o incomodar (ou incomodá-lo).
- Quando o infinitivo vier precedido pela preposição a, a próclise não será possível se o pronome for o ou a.
Estamos a contemplá-la.
Se soubesse, não continuaria a lê-lo.
Começou a lhe ensinar português (ou ensinar-lhe).
Vejamos este assunto numa questão de prova de concurso:
(FCC/2013/PGE-BA/Assistente de Procuradoria)
Os pronomes estão empregados corretamente em:
a) Se observa muita falta de educação nos ônibus onde, muitas vezes, se desrespeita o direito de os passageiros viajarem em paz.
b) Observa-se muita falta de educação nos ônibus onde desrespeita-se, muitas vezes, o direito de os passageiros viajarem em paz.
c) Se observa muita falta de educação nos ônibus onde, muitas vezes, não respeita-se o direito de os passageiros viajarem em paz.
d) Se observa muita falta de educação nos ônibus em que não respeita-se, muitas vezes, o direito de os passageiros viajarem em paz.
e) Observa-se muita falta de educação nos ônibus em que, muitas vezes, não se respeita o direito de os passageiros viajarem em paz.
Comentário
Alternativa A: errada. O pronome oblíquo átono “Se” não pode iniciar a oração. Eis a correção: Observa-se. Cuidado com o segundo “se”, pois ele não inicia a oração, que é iniciada pelo pronome relativo “onde”, o qual também o atrai.
Alternativa B: errada. O pronome relativo “onde” atrai o pronome “se”. Portanto a colocação correta é proclítica: onde se desrespeita.
Alternativa C: errada. O pronome oblíquo átono “Se” não pode iniciar a oração. O segundo “se” agora é atraído pelo advérbio “não” e deve ser colocado numa posição proclítica: não se respeita.
Alternativa D: errada. O pronome oblíquo átono “Se” não pode iniciar a oração, conforme já falei aqui. Novamente o segundo “se” está numa posição inadequada, pois é atraído pelo advérbio “não”: não se respeita.
Resposta: E.
Professor Albert Iglésia (Língua Portuguesa – outubro/17)